Crítica | Planeta dos Macacos: O Confronto

“Eu pensei que tínhamos alguma chance”, diz um personagem humano em certo momento de Planeta dos Macacos: O Confronto, ao perceber a sua impotência em relação à situação em que se encontra. E é esse sentimento de fragilidade, somado à melancolia, que impera nesse novo trabalho do sempre competente Matt Reeves (Deixe-me Entrar), que entrega aqui um dos melhores capítulos da franquia Planeta dos Macacos.

Escrito por Mark Bomback (Wolverine: Imortal), Amanda Silver e Rick Jaffa (ambos de Planeta dos Macacos: A Origem), o roteiro se passa 10 anos depois dos acontecimentos do longa anterior, e mostra César (Andy Serkis) como um pai de família e líder de uma comunidade de macacos evoluídos (outros deles também arriscam as suas primeiras palavras) e extremamente organizada, com direito a escolas que ensinam linguagens dos sinais e os mandamentos daquela sociedade símia, que há dois anos não vê nenhum sinal dos humanos (os créditos iniciais ilustram muito bem o alastramento do vírus que dizimou grande parte da população, assim como os curtas lançados anteriormente). Mas quando um grupo de humanos se aproxima do lar dos macacos, visando utilizar uma hidroelétrica localizada próximo dali para gerar energia para sua comunidade, isso causa conflitos dentro daquela sociedade, levando alguns macacos a questionarem a liderança de César.

Pela sinopse acima, é possível perceber que o foco desse novo filme não são os humanos. Na verdade, o longa é, em sua essência, sobre um conflito político entre lideranças dentro de uma sociedade que logo passa de democrática a totalitária, e todos os seus conflitos e reviravoltas (e até os dramas) são estrelados pelos macacos. O grupo de humanos, liderado Jason Clarke (O Grande Gatsby), não passa de coadjuvante dentro de uma trama em que eles são impotentes em relação ao seu resultado (qualquer um que já tenha visto o original, de 1967, sabe disso). E por mais que seja bonito ver uma aliança entre espécies se formando, é visível (e previsível) que ela não surtirá o efeito desejado. Sabendo disso, Reeves acertadamente aposta numa abordagem melancólica da situação. Além de destacarem o desespero do grupo de humanos em meio aos ataques que sofrem, as cenas de ação apresentam uma depressiva música de fundo, dando um tom derradeiro aos inúteis atos de resistência que são mostrados.

Isso não impede, porém, que Reeves componha algumas sequências de ação memoráveis, como aquela envolvendo um tanque de guerra, numa cena quase sem cortes que detalha a destruição do conflito. Da mesma forma, no momento que em que os macacos visitam a comunidade humana pela primeira vez, é interessante perceber como o diretor compõe o quadro de maneira a colocar Clarke no centro e sendo a única pessoa de branco, contrastando com os macacos (e seus pelos escuros) e os humanos (todos com vestes escuras também), o que imediatamente denota a sua natureza pacifista. Aliás, é exatamente essa sua natureza pacifista que quase causa a sua ruína. (Atenção, o restante desse parágrafo conterá spoilers. Só leia se já tiver assistido ao filme.) Quando o personagem de Gary Oldman (Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge) revela o seu plano de explodir a torre onde estão reunidos todos os macacos, Clarke é contrário a essa ideia, não concordando com o extermínio de uma espécie inteira. Porém, pensando racionalmente e conhecendo a trama do longa original, vejo que esse plano talvez fosse a última esperança de a sociedade humana sobreviver e escapar daquele terrível futuro em que serviam de cobaias e eram escravizados pelos macacos. Se Gary Oldman (mal aproveitado no filme, devo destacar) conseguisse de fato matar todos os macacos inteligentes, só sobrariam as pessoas imunes ao vírus, e a humanidade estaria salva. Sim, essa liberdade proporcionada viria à custa de um assassinato em massa, o que, sem dúvidas é um ato irrepreensível, mas que, de maneira alguma, é inédito dentro da história da humanidade. Acho, inclusive, que é por isso que os roteiristas fizeram questão de mostrar o plano sendo executado, e falhando. Para evitar esse tipo de pensamento e preservar a áurea de bom moço de Clarke. (Fim do spoiler.)

É claro que Planeta dos Macacos: O Confronto não funcionaria caso o seu protagonista não funcionasse. Ouvi um podcast recentemente em que o crítico Renné França afirmou que César está se encaminhando para se tornar um dos grandes personagens da história do cinema. Não acho exagero. A composição de Serkis para o papel, inteiramente feito por meio de captura de movimentos, dá a César mais humanidade do que os próprios humanos ali apresentados. É ele quem demonstra raiva quando precisa e empatia quando necessário. É ele quem carrega praticamente toda a narrativa, quem é mais emotivo e quem é mais bem desenvolvido na trama. E é dele grande parte da responsabilidade por este ser um excelente filme.

(Dawn of The Planet of the Apes | Aventura/Sci-fi | EUA | 2014 | 130 min.)
Direção: Matt Reeves
Roteiro: Rick Jaffa, Amanda Silver e Mark Bomback
Elenco: Andy Serkis, Jason Clarke, Gary Oldman, Keri Russell, Toby Kebbell, Kodi Smit-McPhee, Judy Greer.