Crítica | Homem-Aranha: De Volta ao Lar

Herói está de volta em uma aventura leve, descontraída e extremamente divertida. 

Quando escrevi sobre Capitão América: Guerra Civil, eu disse (e repito) que o Homem-Aranha não teve uma presença marcante naquele filme. Ele foi inserido de maneira brusca e descartado logo em seguida à cena de batalha, sem que a sua participação tivesse importância alguma no decorrer da história. Sendo assim, a primeira aparição do ator Tom Holland no papel deixou uma sensação agridoce, demonstrando um imenso potencial desperdiçado numa narrativa que não o suportava. Nada disso se repete aqui. Homem-Aranha: De Volta ao Lar serve não apenas para reforçar todo aquele potencial que o personagem e o ator têm, mas também, e principalmente, para alocá-lo a um universo leve e divertido, onde ele transita mais à vontade.
A trama se passa meses após os eventos de Guerra Civil e mostra Peter Parker (Holland) tendo que se adaptar à sua vida de colegial. Entediado com a sua rotina sem aventuras, ele veste o uniforme do Homem-Aranha após o término das suas aulas e tenta ajudar o seu bairro, mesmo que muitas vezes não seja bem sucedido nisso. Paralelamente, Adrian Toomes (Michael Keaton), um ex-empreiteiro que trabalhava recolhendo os destroços das batalhas dos Vingadores, começa a construir armas com essas sucatas e inicia um lucrativo negócio de vendas de armas híbridas – que misturam tecnologia humana e alienígena. Até então, ele tinha o cuidado de não chamar muita atenção para si, mas isso muda quando o jovem herói aracnídeo resolve investigar Toomes por conta própria, contrariando as ordens do seu mentor Tony Stark (Robert Downey Jr.).
Inserido de maneira orgânica na narrativa (em vez de ser apenas um caça-níquel), Tony Stark tem uma grande importância em Homem-Aranha: De Volta ao Lar: ele é visto como uma figura paterna para o protagonista. Isso torna a dinâmica dos dois ainda mais complexa, já que o garoto está sempre tentando provar-se digno da atenção do adulto e coloca a sua própria vida em risco no processo. Em relação aos filmes-solo anteriores, existe uma diferença muito grande no tom, já que aqueles eram dominados pela tragédia pessoal de Peter Parker. Mas agora que o personagem já está estabelecido, não é preciso contar aquela mesma história de origem que todo mundo já conhece. Ele também não precisa carregar o estigma do trauma o tempo todo – por mais que fique subentendido –, permitindo-se ser um adolescente quase normal.
Desta forma, características específicas da adolescência ganham mais importância, como as suas amizades no colégio (o gordinho Ned é hilário), a paixão platônica pela garota mais velha, a primeira festa e a tentativa frustrada de tentar conciliar tudo isso a uma vida de heroísmo. E ao focar a atenção na juventude do protagonista, o longa nos apresenta a um Homem-Aranha que ainda não é necessariamente um super-herói. Apoiado numa atuação carismática de Tom Holland, o Peter Parker que vemos aqui é alguém bastante determinado, porém jovem e inexperiente. Tanto é que boa parte das cenas ação mostram o Homem-Aranha resolvendo uma situação que ele próprio causou. E, na maioria das vezes, sua tentativa de consertar o problema acaba agravando-o ainda mais.
Já Michael Keaton encarna o Abutre como alguém inteligente, sensato (na medida do possível) e com um estranho senso de moral e ética. É interessante observar que ele enxerga a vida de crime como uma maneira de conseguir manter-se à margem da sociedade, e não acima dela. E mesmo ganhando uma fortuna com seus crimes, ele continua fazendo o mesmo que fazia quando era um empreiteiro: recolhendo a sucata dos grandes heróis e vivendo abaixo do radar deles. Trata-se, portanto, de um personagem muito bem desenvolvido. Confesso, porém, que o descaso em relação à Tia May (Marisa Tomei), reduzida a uma mera figurante de luxo, é um pouco decepcionante, mas não chega a estragar a diversão proposta pelo diretor Jon Watts.
Dono de uma carreira cinematográfica curta, Watts é o tipo de diretor que adapta seu estilo ao projeto que está liderando. E por mais que nunca tenha trabalhado com grandes orçamentos antes, ambos os seus longas-metragens anteriores (A Viatura e Clown) flertaram com o universo infanto-juvenil. Aqui ele encontra o equilíbrio certo entre o humor e o drama, e não se preocupa em criar grandes sequências de ação – até o embate final é bastante contido. Em entrevistas anteriores, o realizador afirmou que sua maior inspiração foram os filmes de John Hughes (responsável por Clube dos Cinco e Curtindo a Vida Adoidado). Ao buscar se aproximar de Hughes, Watts conseguiu trazer um tom leve e descontraído necessário para esta aventura. Não sei dizer ao certo se Homem-Aranha: De Volta ao Lar é a melhor aparição do personagem no cinema (tenho uma admiração muito grande por algumas outras), mas certamente é a mais divertida.
FICHA TÉCNICA:
Título Original: Spider-Man: Homecoming
Gênero: Aventura
País: EUA
Direção: Jon Watts
Roteiro: Jonathan Goldstein, John Francis Daley, Jon Watts, Christopher Ford, Chris McKenna, Erik Sommers
Elenco: Tom Holland, Michael Keaton, Robert Downey Jr., Laura Harrier, Marisa Tomei, Jon Favreau, Zendaya, Jacob Batalon, Donald Glover, Tony Revolori, Bokeem Woodbine, Angourie Rice, Abraham Attah, Tyne Daly, Selenis Leyva, Logan Marshall-Green, Michael Chernus, Kenneth Choi, Hannibal Buress, Martin Starr, Gwyneth Paltrow, Jennifer Connelly.