CRÍTICA: TOMBOY

Tomboy é o termo utilizado para denominar meninas que exibem características e comportamentos tipicamente masculinos, como: andar na companhia de rapazes; preferir brincadeiras de meninos; usar roupas e cortes de cabelo não condizentes com seu gênero; etc. Quando muito jovens, antes do desenvolvimento dos hormônios, é fácil confundir uma “maria-joão” (como é chamada aqui) com um verdadeiro menino.

E é isso que acontece com Laure (Zoé Héran), uma jovem francesa que se muda, juntamente com os pais e a irmã mais nova, para um condomínio nos subúrbios de Paris. Lá ela faz amizade com Lisa e, quando questionando sobre o seu nome, Laure responde: Michael. Com aparência e vestimentas masculinas, “Michael” consegue enganar Lisa e todas as outras crianças do prédio; porém agora a garota precisa esconder o seu segredo dos seus pais, enquanto o relacionamento com a nova amiga começa a tomar outros rumos.

Muitos diretores mais “polêmicos” utilizariam essa sinopse para fazer uma discussão sobre sexualidade ou algo parecido. Ainda que isso também esteja presente aqui, uma das maiores qualidades do longa de Céline Scianna (“Lírios D’água”, 2007) está na abordagem humana que ela dá à sua protagonista. Sem se preocupar em responder questionamentos comuns, como “por que ela age assim?”, a diretora foca a sua câmera no cotiadiano de Laure e nas dificuldades de manter seu disfarce (fazendo um pênis falso para poder usar roupa de banho, por exemplo). A impressão é que público vislumbra apenas um breve período da vida dela.

Prova disso é a maneira que a cineasta apresenta a personagem: nos primeiros minutos da projeção o nome da protogonista nunca é mencionado – justamente para que o espectador, assim como os personagens, tenha uma surpresa quando descobre o seu segredo. E sendo essa uma relação já estabelecida entre aquelas pessoas, o que vemos na tela são apenas sinais e pistas do que pode ter acontecido no passado (como o fato de que talvez o pai – devido às constantes mudanças de endereço da família por sua causa – se culpe pelo comportamento da filha e que, por causa disso, não a castigue severamente).

A própria relação de “Michael” com Lisa nunca deixa claro se Laurie realmente gosta da garota ou se faz tudo aqui apenas para manter seu disfarce. Afinal, em certo momento, é possível reparar um certo olhar de admiração dela para um dos seus coleguinhas. Mais do que isso, sua origem comportamental nunca é sequer mencionada. Ela é assim porque é. É o seu jeito.

Essa ausência de respostas – e o final um tanto “simples” demais – pode incomodar algumas pessoas (não me incluo nessa lista). Porém nada disso desmerece o trabalho de Scianna, que faz um filme sério e, acima de tudo, humano.

(idem – França – 2011)
Direção: Céline Sciamma
Roteiro: Céline Sciamma

Elenco: Zoé Héran, Malonn Lévana, Jeanne Disson, Sophie Cattani, Mathieu Demy.

Nota:(Ótimo) por Daniel Medeiros


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