Crítica | Jack Reacher: O Último Tiro

Jack Reacher é um personagem ficcional criado pelo escritor Lee Child e protagonista de mais de uma dezena de livros, a maioria deles não lançada aqui no Brasil. Apesar das diferenças físicas em relação ao personagem – que é descrito como um brutamontes com quase 2 metros de altura e mais de 100 quilos –, Tom Cruise assumiu a persona do herói em sua primeira incursão no cinema – além de atuar como produtor do longa. Mas se o nome de Cruise inspira confiança em qualquer projeto ao qual ele se associe, o nome Christopher McQuarrie – que tem um currículo um tanto irregular, contendo bons textos como Os Suspeitos e outros nem tanto, como O Turista – no roteiro e direção gera apenas desconfiança. E com razão.

Na trama, baseada no livro “Um Tiro” (One Shot), o ex-policial do exército Jack Reacher (Cruise) é chamado para investigar um tiroteio que culminou na morte de cinco pessoas inocentes. Auxiliado por Helen (Rosamund Pike), advogada do homem acusado de ser o atirador (que foi quem solicitou a presença de Reacher), e contrariando a vontade do promotor (Richard Jenkins) e do detetive encarregado (David Oyelowo), Reacher inicia sua investigação e logo se vê em meio a uma conspiração que envolve, de certa maneira, um misterioso homem conhecido apenas como Zec (Werner Herzog).

Iniciando a projeção com uma interessante cena de tiroteio, em que o atirador toma o tempo necessário na escolha das suas vítimas e o design de som enfatiza o silêncio e a respiração do mesmo, o longa utiliza-se de um recurso interessante ao mostrar o protagonista ser “apresentado” à sua própria história: inicialmente, a narrativa acompanhava o detetive Emerson e, após a chegada de Reacher, o roteiro exclui o primeiro e foca-se apenas no segundo. E não deixa de ser notável que o herói da história seja primeiro conhecido através de seus feitos (afinal, como foi mencionado, essa é sua primeira aparição no cinema) para somente depois ele ganhar um rosto – nesse caso, também vale destacar a montagem intercalada mostrando as cicatrizes no seu corpo ao mesmo tempo em que o narrador fala sobre seus méritos militares.

Entretanto, os momentos descritos acima apontam as poucas qualidades apresentadas pelo filme. De resto, diretor/roteirista limita-se a criar uma trama que não prende a atenção e com um ritmo bastante irregular. E por mais que seja um acerto chamar o cineasta alemão Werner Herzog – com seu inconfundível sotaque carregado – para interpretar o vilão, e mostrá-lo constantemente envolto em sombras – como forma de ilustrar a aura misteriosa que o cerca –, McQuarrie  não aproveita o potencial da sua criação ao apresentar o personagem, logo na primeira aparição em tela, explicando parte do seu passado e sugerindo auto-mutilação a uma vítima sua (!).

Mas o principal problema de O Último Tiro é o fato de que, em nenhum momento, sente-se a necessidade real da presença do protagonista naquela história. Afinal, qualquer um (a advogada, por exemplo) seria capaz de supor que um ex-militar com experiência que pretende matar cinco pessoas inocentes não estacionaria seu carro em um local cheio de câmeras de segurança e ainda pagaria o estacionamento com uma moeda que contém sua impressão digital. Além disso, a decisão do roteiro de manter suspense em relação as motivações daquelas pessoas acaba se revelando preguiçosa, já que as únicas explicações que ouvimos é que não existe dinheiro suficiente que impeça o vilão de cumprir seus planos e que certo personagem, quando é revelada sua traição, “não teve escolha”.

Ainda que o carisma de Tom Cruise mantenha-se intacto e seja o ponto alto do filme – a cena em que ele sai de um carro em movimento e se mistura na multidão só funciona porque ele é o Tom Cruise –, o longa parece não saber se equilibrar entre uma abordagem mais crua – em certo momento ele segura a cabeça de uma pessoa e utiliza-a para bater em outra – e outra mais cômica – fazendo piada com a garota do bar. A impressão que fica é que se tentou fazer uma mistura entre a trilogia Bourne e a série Missão: Impossível. O problema é que o resultado, que poderia ser muito bom, acabou se tornando um produto genérico, que não ousa como o primeiro e nem diverte como o segundo.

(Jack Reacher – Ação – EUA – 2012 – 130 min.)
Direção: Christopher McQuarrie
Roteiro: Christopher McQuarrie, com base no livro de Lee Child.
Elenco: Tom Cruise, Rosamund Pike, Richard Jenkins, David Oyelowo, Werner Herzog, Jai Courtney, Joseph Sikora, Alexia Fast.